Com o objetivo de orientar e incentivar a gestão adequada dos resíduos da construção civil, uma cartilha sobre boas práticas de manejo e destinação desses materiais foi lançada em Campo Grande. A iniciativa é da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), com apoio de diversas instituições, entre elas o Crea-MS.
O material apresenta orientações claras sobre responsabilidades, penalidades e benefícios relacionados ao gerenciamento de resíduos gerados em obras, reformas e demolições. A proposta é contribuir para uma construção civil mais sustentável, reduzindo o impacto ambiental e promovendo o reaproveitamento de materiais.
Segundo o último relatório do Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão de Resíduos Sólidos (Sinir), apenas 10% dos resíduos gerados no Brasil são reciclados, embora mais de 60% tenham potencial de reuso ou reciclagem.
Coordenada pela engenheira civil e professora Dra. da UFMS, Ana Paula Milani, e pelo Promotor de Justiça Luiz Antônio Freitas de Almeida, a cartilha foi elaborada pelas pesquisadoras Enilda Maria de Freitas e Mayara Tartarotti da Silva.
Na entrevista a seguir, a professora Ana Paula Milani fala sobre a importância da iniciativa e os principais desafios para uma gestão mais eficiente dos resíduos de obra.
Crea-MS – Como surgiu a ideia de desenvolver a Cartilha de Boas Práticas para o Manejo e Destinação dos Resíduos da Construção Civil? Que fatores motivaram essa iniciativa e como se deu o processo até a elaboração final do material? Dentro desse contexto, qual o principal desafio hoje para a gestão adequada desses resíduos, tanto em Campo Grande quanto no cenário nacional?
Ana Milani – A cartilha surgiu da necessidade de aprimoramento da cadeia de gestão dos resíduos sólidos em Campo Grande, pois há escassa participação da construção civil no sistema de logística reversa e circularidade do setor. Por meio dos estudos do projeto Eco Ciclo Campo Grande, junto ao MPMS, foram diagnosticadas lacunas na implementação do Plano de Gerenciamento Integrado dos Resíduos da Construção Civil em Campo Grande (PGIRCC), sendo o maior desafio a falta de separação do RCC pelo gerador — ou seja, o correto manejo do RCC no canteiro de obra, independentemente do porte da obra. É dessa forma que se inicia um gerenciamento eficiente dos resíduos. Entendendo que os responsáveis por implementar esse processo são os profissionais da área da construção, foi materializada a cartilha para guiá-los nas melhores práticas de manejo e destinação do RCC em nossa cidade.
Crea-MS – Como a cartilha pode ajudar profissionais e empresas a adotarem práticas mais sustentáveis no manejo desses resíduos?
Ana Milani – A cartilha está escrita em uma linguagem técnica, porém simplificada, para abranger todos os responsáveis pelo empreendimento, incluindo o engenheiro/arquiteto, o trabalhador, o prestador de serviço e o próprio proprietário. As práticas apresentadas são de fácil acesso e rápida aplicação, sem onerar o custo da obra. Também são destacadas ações para engajar a equipe do canteiro de obras na execução do correto manejo do RCC, além dos ganhos econômico-sociais que a empresa pode alcançar ao implementar tais práticas.
Crea-MS – Quais são as consequências ambientais e legais para quem não faz a gestão correta dos resíduos de obra?
Ana Milani – Ambientalmente: saturação dos aterros municipais e descarte de entulhos em locais inadequados; desperdício de material residual nobre para produção de agregados reciclados; e uso crescente de recursos naturais.
Legalmente: multas e penalidades, como interrupção das atividades da obra ou serviço, e impedimento da emissão do Habite-se ou da Certidão de Demolição.
Na sua visão, quais avanços ainda são necessários para que a gestão de resíduos na construção civil se torne mais eficiente?
Os profissionais da construção civil precisam entender que o resíduo gerado em sua obra é de sua responsabilidade — assim como o lixo da sua casa, que deve ser separado em orgânico e reciclável. A partir dessa compreensão, durante o processo de gerenciamento da construção, reforma ou demolição, será “normal” aplicar as práticas de manejo e destinação no dia a dia do canteiro de obras.
Sob o aspecto da atuação do poder público, as legislações existentes ainda são sutis quanto às obrigatoriedades, o que pode ser melhorado com decretos que determinem, por exemplo, o uso obrigatório de agregados reciclados em determinados ambientes — fomentando, assim, a cadeia de reciclagem dos resíduos da construção civil (RCC).
Comunicação Crea-MS