O mês de abril foi escolhido para registrar um importante movimento relacionado à prevenção de acidentes de trabalho, o Abril Verde. Este é um mês com duas datas significativas: 7 é Dia Mundial da Saúde e 27 é Dia Internacional em Memória às Vítimas de Acidentes do Trabalho e marcará uma série de ações com o objetivo de reduzir os acidentes de trabalho e os agravos à saúde do trabalhador, e mobilizar o envolvimento da sociedade, dos órgãos de governos, empresas, entidades de classe, para prevenir e alertar sobre os problemas que ocorrem no mundo do trabalho e em decorrência do mesmo.
Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), divulgados em 2013, apontam que 2 milhões de pessoas morrem por ano por conta de doenças ocupacionais no mundo. Já o número de acidentes de trabalho fatais chega a 321 mil, ao ano. Neste panorama, a cada 15 segundos, um trabalhador morre em decorrência de doença relacionada ao trabalho. O Brasil é 4º colocado no ranking mundial de acidentes fatais de trabalho, com quase 700 mil acidentes e 4 mil mortes, anualmente em decorrência de acidentes de trabalho.
Dados divulgados em 2015 no Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho apontam que Mato Grosso do Sul registrou 9.766 acidentes de trabalho, sendo que 6.126 foram acidentes típicos; 1.559 ocorridos no trajeto e 173 doenças do trabalho. O restante, 1.908, não teve a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) registrada.
Engenheira eletricista e de Segurança do Trabalho, Luciana Macedo tem a segunda como sua principal atividade profissional. Conselheira do Crea-MS, a engenheira esclarece aspectos práticos e normativos da segurança do trabalho na entrevista abaixo.
Em 1985, a Lei 7410 dispôs sobre a Especialização de Engenheiros em Engenharia de Segurança do Trabalho. Para regulamentar o exercício profissional, o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) editou, em 1991, a Resolução 359, dispondo sobre o exercício profissional, o registro e as atividades do Engenheiro de Segurança do Trabalho, que atualmente são 477 registrados no Crea-MS.
Anualmente, o Brasil registra cerca de 700 mil acidentes de trabalho. Deste total, 80 mil ocorrem nos setores da indústria extrativa e construção civil e exploração agropecuária, que são atividades que envolvem diretamente as áreas da engenharia e agronomia. Qual a sua avaliação sobre isto? Você acredita que este número, e o consequente impacto na economia, poderiam ser menores?
Não podemos admitir que estes números sejam aceitos como meras fatalidades. Estamos vivendo a era da tecnologia, da disponibilidade de informações e precisamos usar isso a nosso favor para evitar que este número cresça. O alto índice de acidentes deve-se a uma soma de fatores, a carga tributária hoje imposta aos empresários faz com que eles não invistam em saúde e segurança como deveriam, a falta de um planejamento para os empresários se adequarem às normativas sem a orientação necessária é outro ponto importante, a conscientização por parte dos trabalhadores contribui para a elevação deste número e uma fiscalização mais atuante poderia ajudar a reduzir estes índices. Sem dúvida, existe um papel fundamental das empresas ao investirem em Segurança do Trabalho, melhorando as condições do ambiente laboral, diminuindo os agentes nocivos (riscos físicos, químicos e biológicos) e por que não dizer os ergonômicos e de acidentes, mas o trabalhador também tem um papel importante de colaborar com a prevenção, seguindo as normas e procedimentos de trabalho estabelecidos, colocando em prática as orientações que recebem nos treinamentos de capacitação e apontando sugestões de melhoria através da CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, por exemplo.
Diferente do que pensa a maior parte da população, todos nós pagamos a conta dessa acidentalidade, pois todos os trabalhadores que sofrem acidentes de trabalho no Brasil recorrem única e exclusivamente à seguridade social, através da Previdência. Então quanto mais “benefícios” o INSS paga para os acidentados, maior a evasão de recursos para bancar as aposentadorias dos que contribuem por tempo de serviço ou por idade, e o que se vê é uma reforma da previdência a cada governo, pois a conta não fecha.
O que é um ambiente seguro? É possível garantir um ambiente livre de riscos aos trabalhadores?
Um ambiente seguro é aquele ambiente onde todas as variáveis possíveis de contribuir para um acidente ou doença sejam controladas, minimizando a possibilidade de um infortúnio acontecer. Com o estudo correto do ambiente e as soluções de engenharia devidamente implantadas, é possível garantir um ambiente com muito menos riscos de acidente, agora já quanto ao controle dos agentes que adoecem os trabalhadores, é possível controlar a insalubridade de tal forma que você pode admitir um trabalho com totais condições de salubridade. A adoção das medidas de controle corretas, elimina todos os fatores geradores de insalubridade nas empresas, estas soluções resultam nos menores índices possíveis de absenteísmo, multas, adicionais salariais, processos trabalhistas e despesas previdenciárias. Desta forma há uma melhora nas condições de trabalho, melhora nas condições do meio ambiente, redução de custos com adicionais e ações trabalhistas e cumprimento de requisitos legais, trabalhistas e previdenciários.
Você pode explicar como pode atuar o Engenheiro de Segurança do Trabalho neste contexto?
Neste contexto, os Engenheiros de Segurança do Trabalho e demais profissionais que trabalham em prol da prevenção do trabalhador, têm um papel fundamental. Trabalhamos para o bem estar dos trabalhadores, para a sustentabilidade das empresas e também para o governo, ajudando a economizar o dinheiro público. Quanto menos se paga para remediar a situação, mais recursos sobram para serem investidos na prevenção. Muitas pessoas não entendem o nosso papel dentro das organizações, acham que estamos lá só pra cobrar o uso dos EPIs – Equipamentos de Proteção Individual, mas antes de chegar a uma medida dessas temos que esgotar todas as medidas de proteção coletiva, adequações no ambiente que possam ser implantadas, medidas administrativas, tais como mudanças nos procedimentos de trabalho, por isso a Engenharia é tão importante neste processo.
Qual sua avaliação sobre a situação normativa e prática da segurança do trabalho no Brasil? É complexa ou é acessível?Existem ações locais e movimentos crescentes evidenciando a preocupação das empresas sobre o assunto. Em Campo Grande, por exemplo, existe o Projeto de Lei nº 8.131/15, que delibera a respeito da promoção anual da Semana Municipal de Prevenção de Acidentes no Trabalho (Sempat), sob a responsabilidade do Executivo e realização em conjunto a entidades de classes, órgãos públicos e privados.
Com a aprovação do projeto, a semana que compreende o dia 28 de abril fica instituída para a realização de atividades que visarão conscientizar e orientar os trabalhadores sobre a importância de conservar e proteger a saúde e integridade física, tais como palestras, workshops, além de consultorias jurídicas sobre temas de saúde, integridade física e segurança no trabalho.
Em âmbito nacional, o mês de abril ficou estabelecido como o Abril Verde. Iniciado em 2014, a campanha tem por objetivo alertar e mobilizar a sociedade para a prevenção de acidentes e das doenças relacionadas ao trabalho. No dia 7 de abril é comemorado o Dia Mundial da Saúde e no dia 28, o Dia Internacional em Memória às Vítimas de Acidentes, estabelecido pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), mas faltam ações mais ostensivas e abrangentes para envolver a sociedade como um todo. Acho importante as ações irem além das empresas privadas e trabalhadores, elas têm que atingir o poder público e ações devem ser desdobradas para atingir as escolas. A conscientização das crianças sobre este assunto pode refletir no futuro índices de acidentes bem menores.
Quais os maiores desafios para os profissionais da Engenharia de Segurança? É a legislação e sua defasagem ou suas constantes atualizações, os órgãos de controle, é a resistência dos empresários e dos trabalhadores?
Infelizmente, as normas não retratam a realidade das organizações. Umas das principais normativas que estão hoje vigentes são datadas de 1978, que são as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego que embora estejam passando por um processo de atualização, faltam comissões multidisciplinares para ouvir todos os atores envolvidos neste processo. As consultas públicas são uma das poucas ferramentas que temos para mudar esta realidade, ter profissionais da área tecnológica escrevendo as normativas também ajuda muito. Precisamos assessorar os órgãos legisladores com os conhecimentos técnicos necessários para a elaboração de uma normativa na área de Engenharia de Segurança do Trabalho.
Trazendo a questão mais para próximo das pessoas, é possível dar dicas de como devemos nos comportar no ambiente de trabalho para que possamos evitar riscos e acidentes?
Investir em uma política de saúde e segurança no trabalho faz com o que as pessoas entendam a preocupação como uma máxima dentro das organizações e todos se envolvem neste processo, mas estou falando de política de verdade, onde o discurso reflete as ações na prática e vice e versa. Quatro estados nos levam aos acidentes e são eles: a pressa, a frustração, o cansaço e a complacência. Estes estados podem causar ou contribuir para alguns erros críticos, que são estar com os olhos e o pensamento longes da tarefa, colocar-se em uma situação de risco e perder o equilíbrio, a tração ou a firmeza. Temos que estar atentos ao que estamos fazendo, por exemplo, por que falar ao celular é proibido enquanto estamos dirigindo? Porque iremos nos concentrar na conversa e desviar a atenção para a sinalização de trânsito e da atividade de dirigir em si (trocar a marcha, dar seta, parar no sinal vermelho, etc.), aumentando a chance de nos envolvermos em um acidente (pensamento longe da tarefa).